segunda-feira, 6 de julho de 2009

Portos seguros não são para sempre

Nessa vida só estamos preparados para - ou melhor dizendo, só aceitamos - mudanças que sejam provocadas por nós. Esse tipo de mudança temos gosto de encarar; são desafios, poderemos provar que somos capazes, que vamos mais longe, et cetera e tal. Mas basta algo mudar sem nos pedir permissão para tremermos na própria base.

Assim estou me sentindo atualmente em função de mudanças que se anunciam na família, somadas às lembranças dos portos seguros que não existem mais. Ao menos para mim, isso tem provocado uma sensação muito ruim. Péssima!

Apesar de ter saído da casa dos meus pais, é impensável não existir a casa verde e rosa de Canoas onde vivi desde quando me descobri gente, com seu quintal amplo, com o jardim da frente cheio das flores que minha avó sempre cultivou, com os vizinhos barulhentos da casa ao lado e com a própria casa azul e branca dos meus avós, que é a primeira do terreno. Entretanto eles cogitam fortemente se mudar para a casa de praia a fim de finalmente serem felizes. Explico: a convivência com a minha avó é extremamente difícil, pois a relação sogra-nora é a mais típica possível. Traduzindo, elas se odeiam! Meu pai e eu sabemos que de fato minha avó é "do mal" e tem culpa no cartório, mas o filho não pode ir contra a própria mãe de maneira tão direta, então... eles querem ir embora.

E apesar de já não morar com eles, a opção de sair foi minha e amigável (mudança provocada por mim), logo está tudo bem em ir praticamente todo fim-de-semana para a tradicional casa verde e rosa. Mas... e quando essa casa não existir mais? Poxa vida, são 25 anos de vida lá! Nesse caso o problema não é passar a pegar um ônibus na rodoviária até o litoral (mesmo que com menos frequência), o problema é que lá não é o meu porto seguro da infância. É como se essa nova realidade roubasse um pedaço de vida do qual não quero me desfazer.

Para completar o quadro de desmoronamento do lugar onde vivi por muitos anos, os vizinhos do outro lado, que moravam ali desde antes de nos instalarmos na casa verde e rosa, decidiram vender o seu enorme terreno para dar lugar a mais um condomínio horizontal super moderno na região. Em questão de duas semanas a mãe e os três filhos casados foram embora e as casas foram literalmente demolidas com tratores. Ao visitar meus pais nesse domingo olhei para o lado e tudo o que vi foi uma montanha de entulhos, no que pensei, suspirando: "ainda lembro de quando era piá e jogava bola com os meninos nesse pátio enorme". Ah sim! E os vizinhos barulhentos do lado oposto já não são mais os mesmos também. O pai de família está viciadíssimo em crack e suspeitamos que já apresentou a pedra à esposa, dado o estado físico/psíquico de ambos. Desolador, desolador.

Esse cenário todo já me deixou bem triste. Porém junte-se a isso o fato de que no final de junho foi "aniversário de óbito" do meu avô que morava na casa da frente. E que foi o avô mais perfeito que qualquer neto poderia ter (e que não merecia ter a esposa que foi minha avó para ele). Para vocês terem uma ideia do grau de malvadeza dela, quando íamos meu avô e eu ao Zaffari todo sábado de manhã ele sempre me dava algum chocolate ou coisa do tipo. Única neta, sabe como é, sempre acaba ganhando mimos. Pois quando chegávamos em casa minha avó me obrigava a dividir com ela o pacote de chocolate, e ainda fazia cena de ciúmes com ele. Pode isso? Uma pessoa capaz desse tipo de birra é capaz de coisas muito piores e mais sérias, que não vêm ao caso. Resultado: não falo mais com ela há uns dois anos pelo menos.
Mas enfim: ele também era de certa forma um porto seguro. Meu amigo da primeira infância. Foi ele quem me ensinou a ler e a fazer contas com três anos, quando eu, bem faceira, colocava uma mochila nas costas e dizia para minha mãe que "ia pra icola do vô". Doces tardes passei com ele, e tão cedo se foi. Eu tinha 12 anos quando ele finalmente perdeu a guerra para o câncer.

Bem... Eu não contei nem metade dos motivos pelos quais tenho me sentido à deriva ultimamente, porque senão esse texto tenderia a um capítulo de livro e não é o objetivo. Sinceramente, eu apenas gostaria de saber reagir melhor a tudo o que não posso conter em minhas mãos. E é muita coisa escorrendo por entre os dedos.

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